Momento eleitoral 3, ou sobre a função dos intelectuais
Tinha me comprometido a escrever mais um texto sobre as eleições, mas decodi que não o farei. Do mesmo modo, daqui até as eleições, vou me dedicar a minha vida e às minhas coisas. A razão é simples. Não vale a pena.
Desde muito tempo tenho tentado usar argumentos para demonstrar que o governo do PT foi um grande avanço na história brasileira, o que não significa dizer que foi perfeito. Pelo contrário, minhas criticas ao partido e a seus erros e problemas têm sido constantes nos últimos anos. Mesmo assim, os fatos indicam que a opção pelo PT, agora, é a menos ruim, sempre com a esperança que eles corrijam seus erros e permitam melhoras.
No entanto, cansei de jogar pérolas aos porcos. Qualquer coisa que eu escrevo ou escrever ou vai reforçar a convicção dos já convencidos ou gerar antipatias em quem já está com a cabeça feita. Cansei de, em muitos posts e mensagens in box, argumentar isso ou aquilo e receber como resposta coisas como “Tudo bem, vc tem razão, mas Aécio já” ou “Tanto faz o que vc diz,vamos tirar a gentalha do poder”.Chega, desisto.
Agora, se a vitória do Aécio acontecer, eu desejo sinceramente que o PT aprenda com seus erros durante os anos de poder. Também desejo que o PSDB aplique sua política a ferro e fogo, com tudo o que tem direito. Quem sabe eu esteja errado e estejamos então no caminho de nos tornarmos a Suécia? Mas, se acontecer o que todos sabemos que acontecerá, eu serei prejudicado? Claro. Minhas verbas de pesquisa, já escassas, diminuirão, as condições de trabalho irão para as cucuias, etc. Mas eu tenho um emprego e uma carreira mais ou menos consolidada. Acho que sobreviverei. Então, que venham os ventos e tempestades, com força, e que salve-se quem puder. A essência da democracia é que cada povo tem o governo que merece, não é? Então, se for o desejo da maioria, boa sorte. Eu cansei.
Amigos, só um detalhe sobre meu texto. Não estou a jogar a toalha e nem perdi a esperança. Só não vou mais brigar no face, pois não se muda a opinião de quem já a tem cristalizada. Se alguém quiser genuinamente debater, entender minha posição, etc, bom, me contate.Mas não vou mais passar uma hora escrevendo sobre problemas no Mercosul ou a crise de crescimento de países de renda média para, ao final, receber um CORRUPÇÃO!! ou DITADURA BOLIVARIANA! Como resposta. Me aconteceu. Chega, minha vida é curta demais para isso.
E é engraçado até, pois muita gente leu o que escrevi, mas ninguém me manda uma mensagem dizendo algo como: mas quais são suas criticas ao PT? E porque, apesar disso, vc diz preferir a Dilma? Nada, continua o dilúvio de bobagem sem fim. Volto a dizer: não joguei a toalha, mas não acho que seja capaz de mudar a cabeça de alguém. A guerrra cultural, ao modelo do Gramsci, foi vencida, mas pelas forças conservadoras. Após anos e anos com toda a mídia elevando os erros (e foram muitos, sim) do PT ao cubo e explorando o ressentimento de classe (não há outra palavra para definir) da classe média ou de quem imagina ser de classe média, o clima mudou. Eles talvez ainda não tenham vencido, mas no mínimo vão chegar bem perto.
Sinto, agora, a sensação da inutilidade relativa dos intelectuais e lembro da Marilena Chauí e da questão do discurso competente e do discurso simplista como mais eficiente. Ela tem toda a razão, ainda que eu veja de forma um pouco diversa e adapte o seu raciocínio. O discurso mais esquemático, polar, realmente funciona muito bem. Na política, aliás, essa é a praxe e o próprio PT usa äs vezes o discurso de nós contra eles. Normal. Nós, intelectuais, contudo, estudamos décadas a fio para quebrar isso, para discutir as verdades estabelecidas, repensar, oferecer soluções, etc.
Daí, contudo, ficamos no papel de fornecedores de uma informação que a maioria das pessoas ou não consegue ou não quer absorver. A sua fonte de informação acaba por se resumir à TV, ler a Veja no consultório do dentista, etc. E essa informação, ao ser batida e rebatida sem parar, repetindo o senso comum, ganha ares de verdade absoluta e estabelecida. E aí de quem questionar. Jornalistas de meia pataca, pastores de quinta categoria e blogueiros raivosos se tornaram os verdadeiros “intelectuais orgânicos”. Se há alguém que leu muito bem o Gramsci foi a direita, por isso estão a vencer a guerra cultural.
Depois, o discurso competente parece ter chegado a um nível inverso. Ninguém questiona demais o médico que diz que vc precisa operar o joelho ou o engenheiro que sugere aumentar a resistência de uma viga. Mas nós, intelectuais, os profissionais do pensamento e da sociedade, somos simplesmente ignorados se não falamos exatamente o que se quer ouvir. Não que tenhamos a verdade absoluta, mas é a se considerar que a opinião de pessoas que estudam anos e décadas certas questões talvez merecessem mais atenção do que o vizinho que repete o senso comum. O discurso competente, para nós, não funciona. Estamos isolados na torre de marfim, e não é por nossa culpa.
Por fim, tenho que rir de uma mensagem que recebi, a qual está circulando por ai. O tom da mensagem era que todos deviamos nos mobilizar para tirar o voto dos analfabetos e garantir que os de nível superior tivessem direito a mais votos, numa espécie de “voto censitário” por instrução: mais anos de estudo, mais votos. Ai, por essa lógica, os analfabetos petistas ficariam para sempre fora do poder. Por si, isso é a negação da democracia e a volta ao século XIX, do qual tantos hoje parecem ter nostalgia.
Mas admito ai a minha maldade. Respondi in box dizendo que a ideia era legal e que gostaria de saber como funcionaria no meu caso, que tenho bacharelado, licenciatura, especialização, mestrado, doutorado, livre docência e 3 pós-doutorados, boa parte no exterior. Eu ganharia quantos votos a mais do que os de nível superior? E iria usar todos para apoiar a Dilma, isso poderia?. Pano rápido, sem resposta. Nós intelectuais podemos ser ignorados, mas aqui e ali dá para enquadrar um coxinha ao menos!